domingo, 31 de janeiro de 2010

MULHERES QUE CORREM COM OS LOBOS
(livro de Clarissa Pinkola Estés)

Artigo retirado do site Absoluta (www.absoluta-online.com.br):

Já completamente cult hoje em dia, o livro “Mulheres que Correm com os Lobos” tem funcionado como um divisor de águas na literatura especializada no Feminino. Mas, muito mais do que isso, a obra de Clarissa Pinkola Estes graciosamente, mas de modo fulminante, transforma na prática o foco e a vida de muitas mulheres.Não é à toa que virou assunto em círculos femininos, blogs e até comunidades no Orkut. É de uma dessas comunidades que o Absoluta pinçou a enfermeira Cleidi Lopes para relatar seu encontro com a obra e a conseqüente transmutação de paradigmas. Cheio de brilho e emoção, o relato é pessoal e não um padrão, mas você está convidada a fazer uma viagem parecida. Você não será a mesma depois de correr um pouquinho com os lobos da vida.

A mulher selvagem em nossa vida
Eu estava demasiadamente triste. Nada parecia ter o poder de me estimular a sair daquele estado de angústia. E assim transcorriam os meses. A resposta final que eu apresentava para quase todas as perguntas, relativas às coisas práticas da vida, era sempre a mesma: “para mim, tanto faz”.Uma pessoa querida da família, cansada talvez de me ver naquele estado, aproximou-se de mim com um livro nas mãos e me disse com severidade: “LEIA!”. Diante do costumeiro “tanto faz”, iniciei a leitura.Mal terminava a introdução e o meu estado emocional já não era o mesmo. Algo nas palavras daquela autora tinha o poder de movimentar sentimentos estagnados. Até que, por fim, estanquei comovida diante de uma frase que, naquele momento crítico, acabava por me devolver a esperança. A frase era: “Quer ajuda psicanalítica, vá colher ossos!”. Foi assim que o livro “Mulheres que Correm com Lobos” lançava sua primeira apresentação no enredo da minha vida.Em geral, são histórias como essas que ouvimos das pessoas, quando perguntadas sobre de que forma chegaram ao livro. Ele quase sempre lhes chega devido à uma dor própria ou à de algum amigo ou parente que, tendo passado por experiência semelhante, o indica. Existe também a versão da indicação por algum terapeuta que, possivelmente, não vê uma saída melhor para iniciar seu trabalho com o analisando do que provocar, através da sua leitura, os momentos oportunos de intervenção no processo terapêutico.Não raro também são aqueles que, ao iniciarem sua leitura, mal conseguem passar da introdução. Por quê? Porque, de cara, acham o livro complexo demais! Bem, de fato, este não é um livro “raso”, para ser lido por quem não tenha um mínimo de desejos de mergulhar profundamente nos seus próprios mistérios, pois o livro nos convida exatamente a isto!Da primeira à última página, vamos gradativamente empreendendo uma viagem a profundidades inimagináveis na nossa psique.Vamos identificando, através das histórias, aspectos até então desconhecidos de nós mesmas e, com isso, a consciência vai aos poucos se enriquecendo de elementos a serem trabalhados. A Clarissa incorpora a própria La que sabe para nós, e nos sentimos seguras diante de seus ensinamentos. Ela nos encoraja a irmos de encontro aos nossos “predadores” e vencê-los, para resgatarmos das sombras tudo o que necessitamos que seja recuperado, tratado e cuidado, para estar novamente na luz.
A Clarissa saber tudo ao nosso respeito - Quantas e quantas vezes torna-se difícil prosseguir e ultrapassar algum trecho do livro... Tacitamente, todas nós sabemos sobre o porquê disto acontecer com certa freqüência. É que existe ali um nó. Existe ali um momento doloroso que não fomos capazes de transmutar na época do seu acontecimento. Alguma história, algum arquétipo, algum mito, expõem nossa própria experiência. Quando isso acontece, “abandonamos” rapidamente a leitura, numa tentativa de fugir do que não estamos prontas para ver; e assim, o livro fica “jogado” em algum canto, esperando e aguardando pacientemente pelo nosso retorno, que indubitavelmente acontecerá.Passarão dias, semanas, meses, anos... Não importa, é certo que voltaremos a ele. Isto porque a qualquer momento estaremos nos doendo de novo e necessitando urgentemente sermos acolhidas pela Clarissa, que parece nos compreender e saber tudo ao nosso respeito. A respeito do interior de todas as mulheres. Então, nos reencontramos com o livro, a página e o marcador na tal “parada crítica”.Quanto maior o mergulho nas entranhas do livro, mais torna-se evidente que o medo e o isolamento vão cedendo lugar aos anseios de compartilhar experiências dentro do arquétipo da mulher selvagem. Necessitamos do engajamento em alguma “matilha” para nos tornarmos coletivas. Inventamos estudos em grupo e grupos de discussões. Recontamos nossas doloridas histórias com olhares e perspectivas diferentes. Fortalecemos-nos e recuperamos nosso aspecto saudável.Eu tenho certeza de que nenhuma mulher que tenha se interessado por este livro também tenha conseguido permanecer em um nível de interação superficial com ele. Afirmo isto porque senti/sinto que é nossa própria alma que o busca sempre que necessita de ajuda, de coragem, ou de um simples gesto de carinho.Clarissa Pinkola Estes graciosamente cumpriu sua tarefa com a humanidade e com a Deusa quando condensou para nós, em “Mulheres que Correm com os Lobos”, as suas vivências e reverência ao arquétipo da mulher selvagem, guardiã de nossa força psíquica e mantenedora da vida criativa de todas as mulheres na sua natureza instintiva.Namastê !!!

Cleidi LopesEnfermeiracleidi.lopes@terra.com.br São Gonçalo/RJ
Ilustraçãohttp://members.cox.net/FotosArquivo pessoal

Um comentário:

  1. O livro "Mulheres que correm com os lobos" me foi indicado por uma professora que marcou minha vida acadêmica NA FACULDADE DE LETRAS DA UFRJ, Gumercinda Gonda, ou Cinda, como todos a chamavam. Obviamente que não era exatamente um livro que fazia parte dos currículos de Letras, e, portanto, jamais indicado pelos professores mais ortodoxos e carrancudos. Cinda, porém, era antes de uma excelente professora, uma mulher que já na aparÊncia esbanjava sua "Loba interior". Fortemente influenciada por sua avó rezadeira, que, por sua vez, era intimamente conectada com todos os tipos de uso das ervas, numa espécie de cultos à terra e a tudo que dela provém, Cinda cresceu ouvindo histórias em uma época na qual as mesmas tinham sua aura de magia, hoje terrivelmente ameaçada pelo papel da tv nos lares de todo o mundo! Estas histórias formaram não apenas o seu caráter, mas também sua crença no poder da intuição, da beleza que vem de dentro de tudo e de todos, e, principalmente, na beleza da palavra que encanta, fascina e nos guia por todos os momentos de nossa vida. Em outras palavras, Cinda já nos introduz à questão principal do livro pelo seu próprio modo de ser, antes mesmo de mencioná-lo, já que é possível sentir que seu olhar não é um olhar comum, "de paisagem", tão comum às mentes limitadas e adestradas de hoje em dia! Ela nos olha a cada um bem no fundo de nossos olhos, como que tentando chacoalhar e acordar cada indivíduo de seu "sono" alienante.

    Percebi, portanto, no livro, o resgate da porção selvagem de cada mulher como forma de resgate da intuição feminina. Muitas mulheres mantém-se alertas ao caminho intuitivo ainda nos dias de hoje, porém sabemos das cobranças excessivas do cotidiano que as fazem perder o "fio da meada". O ritmo frenético da vida, que vai, no seu percurso, acumulando tarefas cada vez mais "sugadoras de energia" (formação acadêmica, casamento, criação de filhos, vida doméstica, vida profissional, vida pessoal) fazem a intuição feminina entrar numa espécie de estado de dormência permanente!! Ou talvez pudéssemos falar em estado de coma, sem correr o risco de pecarmos pelo excesso!! Por meio da leitura dos arquétipos que se encontram na base da formação estrutural das mulheres, a autora Clarissa P. Estés pretende lançar-se à tarefa de "recolhedora de ossos".

    Interpretei esse "recolher ossos" como a tarefa de entrar em contato com a nossa alma, sabermos exatamente o que ELA necessita e não saber o que a sociedade quer que necessitemos!! Trata-se de um processo, nada fácil e nem tampouco prazeroso, de entrar em contato com a necessidade real e não com as "necessidades artificiais", criadas pela histeria da sociedade de consumo. Ou seja, temos de "cavar" fundo em nós mesmos, sujar as mãos, sentir odores desagradáveis, até que possamos enfim alcançar o brilho da nossa mais pura e clara necessidade,e, consequentemente, aquilo que verdadeiramente somos.

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